Medidas polêmicas propostas nos três campos afetam de forma clara a vida do trabalhado — por Jaqueline Suarez, Letícia Sabbatini e Tiago Bruno
Desde que assumiu o governo, em abril de 2016, Michel Temer (PMDB) vem propondo uma série de medidas para transformar o funcionamento e o investimento em diversos setores públicos, começando pela Educação e Saúde . No final do ano passado, as mudanças chegaram ao campo do trabalho, através da Lei da Terceirização e das Reformas Trabalhista e da Previdência. As propostas, que propõem, em conjunto, remodelar as relações de trabalho, tramitam em tempo recorde. Entre os argumentos do Governo Federal está a recuperação econômica do país, na qual as reformas são vistas como salva-vidas financeiro do Brasil.
Entretanto o pacote ganhou freio quando áudios de uma ligação telefônica entre Temer e o empresário Joesley Batista, da JBS, vazaram na imprensa. Mesmo com a tentativa do governo em dar ar de normalidade no processo, foi notável que as medidas perderam o fôlego. A base de Temer já não parece mais tão estável e o presidente responde agora pelo crime de corrupção passiva no STF (Supremo Tribunal Federal).
A reforma trabalhista, rapidamente aprovada na Câmara dos Deputados, chegou ao Senado Federal no final de abril de 2017, foi aprovada no último dia 11 de julho e sancionada no dia 13, pelo presidente Michel Temer.
Na Câmara, os deputados ainda discutem modificações ao texto original da Reforma da Previdência. Temendo não ter o apoio necessário para aprová-la, o Governo Federal estuda outras soluções para driblar o processo regular e inserir as mudanças através da legislação complementar ordinária. Na prática, isso reduziria para maioria simples a quantidade de votos necessários para sua aprovação.
Até mesmo a Lei da Terceirização, sancionada por Temer em março, tem sentido os impactos da crise política. No último dia 26, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou uma ação no STF, alegando a inconstitucionalidade do projeto. Caso seja julgado inconstitucional, o projeto poderá ser revertido.
Enquanto isso, nas ruas, movimentos sociais, sindicatos, trabalhadores e estudantes tentam pressionar os parlamentares e barrar o avanço das reformas. Apenas este ano, duas paralisações gerais já foram organizadas em todo o país, a última no dia 30 de junho. Além da greve geral, diversos protestos vêm sendo organizados regularmente de norte a sul do Brasil, como forma de lutar contra o pacote de reformas e pela saída de Michel Temer da presidência.
Reforma Trabalhista: direitos em risco
A Reforma Trabalhista, a primeira a ser sancionada, entrará em vigor daqui a quatro meses, conforme previsto na nova legislação. Desde que surgiu, foi palco de rejeição popular, ganhou as manchetes dos jornais, as rodas de conversa e motivou manifestações por todo país, deixando exposta a insatisfação da maior parte dos brasileiros. Insatisfação esta que pode ser mensurada na enquete disponível no site do Senado Federal. Até o dia 05 de junho, mais de 180 mil pessoas haviam participado, das quais pouco mais de 167 mil diziam-se contrárias a essa reforma.
Para grande parte dos trabalhadores e sindicatos, a Reforma Trabalhista representa perda de direitos. Um dos pontos centrais da proposta é permitir a sobreposição de acordos coletivos e individuais à lei. Na prática, significa que as empresas vão ter liberdade para negociar com os empregados as condições de trabalho e remuneração, mesmo que estas contrariem a legislação.
“A coisa mais perversa que tem nessa reforma é que vai ficar valendo o acordo sobre o legislado. Ou seja, você vai estar trabalhando em uma empresa e se essa empresa está passando por dificuldades financeiras e propõe o não pagamento do 13º e mais algum outro tipo de corte, ela vai propor uma assembleia e os trabalhadores vão decidir se aceitam ou não. E se não aceitarem, possivelmente, vão ser mandados embora e, obviamente, eles vão aceitar na pressão”, explica Paulo Guimarães, membro do sindicato dos engenheiros.
Nas palavras do Governo Federal e de parlamentares a favor do projeto, essa flexibilização traria benefícios ao trabalhador, mas na prática esse efeito tende a ser o oposto, como explicou o ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho) Maurício Godinho à Agência Brasil.
“A reforma, como todos sabem, é bastante larga, profunda e é uma reforma que, com todo respeito, retira muitos direitos, mas com uma inteligência, com uma sagacidade sem par. Ela não faz a retirada automática. Ela permite que os direitos sejam retirados na prática. Então, aqueles que dizem que não há retirada de direito também não estão cometendo inverdades. Os direitos não estão exatamente todos sendo retirados. Poderão ser retirados no dia a dia da relação de emprego”, argumenta Guimarães.
E, nesse contexto, torna-se essencial pensar qual é o poder de negociação do empregado brasileiro. Segundo pesquisa do IBGE, a taxa de desemprego chegou a 13,7% nos três primeiros meses deste ano. Para entender melhor o que esse número representa, países como o Peru e a Argentina têm índices próximos a 7,5%. Além disso, uma das mudanças propostas afeta diretamente a capacidade de reivindicação dos trabalhadores: a perda de imunidade e estabilidade dos representantes sindicais. Com o emprego ameaçado, quem vai se expor em uma negociação contra o próprio patrão?
Ao todo, a Reforma Trabalhista propõem quase 100 alterações à CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). São mudanças na duração da jornada de trabalho, no pagamento de horas extras, nas férias, nos contratos de trabalho, entre muitos outras. Em suma, todos os direitos assegurados na CLT atual, criada em 1943, tornam-se passíveis de negociação entre patrões e empregados, inclusive o salário mínimo. Veja aqui ponto a ponto dos principais itens que foram modificados.
Sob o pretexto de rombo crescente e déficit estimado em 180 bilhões para 2017, o governo Michel Temer propôs também a Reforma da Previdência. Composta por um conjunto de medidas que, segundo os defensores da proposta, visam equilibrar as contas e diminuir o rombo, a reforma tem sofrido diversas alterações em seu texto base, apresentado na câmara pelo Deputado Artur Maia (PPS-BA).
Antes, era possível se aposentar sem idade mínima, com tempo mínimo de 15 anos de contribuição. Hoje, com a reforma, a proposta de idade mínima para mulheres é de 62 anos e para homens, 65. Ambos com ao menos 25 anos de contribuição. Segundo pesquisa do Datafolha, encomendada pelo jornal Folha de S. Paulo, a taxa de rejeição dos brasileiros pela reforma chega a 71%. Entre os funcionários públicos, a rejeição é de 83%.
Além de algumas classes de trabalhadores não serem afetados, como militares e servidores estaduais e municipais, quem já se aposentou ou poderá se aposentar até a aprovação da reforma também não será atingido.
O aumento da expectativa de vida da população é um dos argumentos utilizados para justificar a reforma. Junto da demografia (envelhecimento da população e aumento na taxa de fecundidade), são os dois motivos relacionados ao fato de que o Brasil possui uma das médias de idade mais baixas do mundo para se aposentar: 59,4 anos.
Quarta-feira, 22 de março de 2017. Foi nesse dia que a Câmara dos Deputados aprovou o projeto que permite a terceirização de quaisquer serviços, inclusive das atividades-fim empresariais. Antes, as empresas poderiam optar por mão de obra terceirizada, mas apenas quando fossem atividades de apoio, também chamadas de atividades-meio, como limpeza, manutenção, secretaria etc. Segundo o Google Trends, na semana da aprovação, o assunto “terceirização” atingiu um grau de interesse máximo entre a população conectada e apesar de não estar mais tão em alta, é um assunto que precisa ser discutido.
A terceirização interfere na relação trabalhador versus gestor, já que é a empresa fornecedora de mão de obra que mantém um vínculo com o profissional contratado. Por exemplo, se um trabalhador terceirizado deseja processar sua empresa por alguma violação dos seus direitos trabalhistas, quem responde por esse processo é primeiramente a empresa de terceirização, gerando uma situação de insegurança jurídica.
Como em todos os assuntos polêmicos, o tema tem seus defensores e aqueles que criticam, e em meio a tantos discursos contrários, só temos a certeza de que um lado ganha e outro perde. Não precisamos nomeá-los para conseguir entender quem vai sair perdendo nessa história.
A CUT (Central Única dos Trabalhadores) condena incessantemente a PL da terceirização (4302/1998), pois afirma que a aprovação foi uma manobra política, já que o projeto de Lei de FHC estava engavetado há anos e só voltou à atual conjuntura para combater o projeto de lei 4300. Esse último foi aprovado em 2015 e proibia a terceirização das atividades-fim de uma empresa.
Além disso, existe o argumento de que o fornecimento de mão de obra terceirizada precariza as condições de trabalho. Segundo um estudo feito pela CUT e pelo DIEES (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), terceirizados trabalham 3 hora a mais que os contratados diretos e recebem salários 25% menores.
Do outro lado, temos as empresas que, em sua maioria, defendem e querem a terceirização. O argumento dessa vez é que, implantando mão de obra terceirizada, o gestor pode se preocupar apenas com a atividade-fim de sua empresa, poupando tempo que seria gasto com a seleção, recrutamento, entrevistas, exame médico e burocracias de contratação.
“Nos dias de hoje, o tempo é um fator crucial em nosso mercado. A terceirização com uma empresa segura me possibilita a otimização dos meus processos de contratação de mão de obra operacional, tudo feito com praticidade e segurança. Recomendo aos meus amigos engenheiros”, afirmou Junior Carletti, da Carletti Engenharia.