Auditório Paulo Freire ficou lotado no dia 22 — por Matheus Queiroz
Num clima de descontração e espírito coletivo, com 11 atores em cena, alunos e professores do curso de Ciências Sociais estrearam a peça “O Santo Excomungado”, no dia 22 de março, com o auditório Paulo Freire lotado, nas imediações do ICHS. Baseado na vida e na obra de Baruch Spinoza (1632-1677), um dos grandes racionalistas da Filosofia Moderna, o projeto foi idealizado como prática de extensão pelos professores do Departamento de Ciências Sociais (DCS), Beatriz Wey e Marcelo Maciel.
A estreia estava programada para dezembro do ano passado, mas a greve dos professores, deflagrada em novembro, ocasionou a mudança na data.
O professor Marcelo Maciel, que interpretou Spinoza, diz ter se sentido muito acolhido pelo ICHS, para essa estreia, pois a direção tomou a iniciativa de mudar todos os refletores e organizar o espaço da frente do auditório para transformar-se em palco.
“Com certeza, quero agradecer publicamente a professora Maria do Rosário por todo o apoio, não só com a troca dos refletores, mas também por ter colocado um funcionário do ICHS inteiramente à nossa disposição. Ficamos muito felizes, pois a apresentação foi um sucesso”, declarou emocionado.
O primeiro encontro do grupo aconteceu em setembro, no mesmo Auditório Paulo Freire (ICHS). Em um momento inicial de confraternização e reconhecimento, eles realizaram diversos exercícios típicos de aulas de teatro, com objetivo de exercitar a atenção, melhorar a concentração e o foco e trabalhar o corpo. Para garantir que o elenco continue preparado e em sintonia, os ensaios foram retomados com o retorno do período letivo.
O grupo se reuniu ao longo do ano de 2016 semanalmente para ensaiar a peça. A professora Beatriz, que também possui formação em teatro, teve a missão de coordenar, roteirizar e dirigir o espetáculo. “Nós percebemos que o teatro poderia ser um caminho para que a gente pudesse preencher uma lacuna no campo de conhecimento dos alunos, despertando interesse pela leitura do Spinoza”, contou com entusiasmo.
Além de interpretar Spinoza na peça, o professor Marcelo atuou também como assistente de pesquisa e direção. “O teatro pode ser um recurso pedagógico. A gente trata de assuntos complexos de uma maneira muito mais empolgante“, descreveu Marcelo, que não tinha experiência em teatro até começar a se envolver com os projetos de Beatriz. A sugestão do autor partiu dele, que conheceu o filósofo após orientar o trabalho de um aluno sobre sua obra.
Além de relatar situações da vida do filósofo, a peça tem como base dois livros escritos por ele. O primeiro é o clássico “Ética demonstrada à maneira dos geômetras” (Martin Claret, 2002), ou simplesmente “Ética de Spinoza”. Dividido em cinco partes, é considerada a obra-prima do renomado pensador holandês. O outro, “Tratado político-teológico” (WMF Martins Pontes, 2009), foi publicado pelo autor de forma anônima.
“Essas duas obras complementam a sua concepção tanto política quanto da política baseada numa percepção ética. A ética também tem papel fundamental quando ele começa a questionar a religião. Ele apresenta uma visão materialista do sentido de Deus. Ele está na natureza, no outro, em mim. O que foi questionado é que se Deus está em tudo, ele não está em lugar nenhum”, explicou Wey. O título da peça é uma referência ao fato de Spinoza ter sido excomungado do judaísmo após a publicação da “Ética” (1677).
É a primeira vez em que a montagem da peça é feita com esse grupo. Entre os alunos que compõem o elenco, estão atores de teatro e até futuros professores que buscam perder a timidez. “Quando eu soube que passei pra Rural, eu tive que abrir mão de bastante coisa e uma dessas coisas era o teatro e as montagens de espetáculo que eu estava participando. Eu soube da peça e fiquei eufórico, porque eu teria a chance de juntar o útil ao agradável: o teatro, a política e a filosofia”, relatou o aluno Wes Roddri, do primeiro período.
O trabalho é coletivo e os docentes também ajudaram na montagem do cenário e do figurino, além de ficarem responsáveis pela arte de divulgação da peça. “Entrei porque sempre tive vontade de fazer teatro e vi nisso uma oportunidade. Estou muito ansiosa para a estreia, vai ser a primeira vez num palco. Espero que dê tudo certo”, comentou entusiasmada a aluna do primeiro período Carol Coelho.
Essa é a quinta montagem idealizada pela dupla de professores. Outros trabalhos cênicos produzidos pelo grupo foram “Punições” (adaptação de três contos de Franz Kafka, 2011), “Em busca da política” (adaptação de textos de Hannah Arendt, 2011), “O Processo” (também baseada na obra de Kafka), e “A banalidade do mal” (baseada na obra “Eichmann em Jerusalém”, de Hannah Arendt, 2015).
“O teatro resgata um jeito de a gente se ver e de se colocar diante do outro que a sala da aula, muito inerte, não proporciona. O teatro é vivo. Não sou tão ingênua de acreditar que vamos fazer uma revolução pela arte, mas eu acredito que pode fazer uma revolução interna. Tem um outro lado que nos fortalece para uma mudança social”, destacou a professora.
O espetáculo também será apresentado no Auditório do Gustavão no P1, em 18 de abril, ás 19h, e deve seguir em turnê por eventos culturais em outras universidades públicas do Rio de Janeiro durante o ano de 2017. A primeira delas, a faculdade de Letras da UFRJ, em 27 de abril.