ICHS realiza I Colóquio Interdisciplinar das Humanidades na UFRRJ

Evento discutiu o ensino na área de Humanas nos dias de hoje e pretende se tornar recorrente a cada ano – Por Lucas Meireles e Bruno Cardoso

 

(Foto: Divulgação)

O ICHS promoveu, no dia 23/03, no Auditório Paulo Freire, o I Colóquio Interdisciplinar do ICHS, com o tema “Desafios e Perspectivas do Ensino das Humanidades no século XXI”.

A proposta desse evento foi trazer à tona um tema que tem sido recorrente em congressos internacionais nos últimos anos. Segundo o professor Marcelo Maciel (DCS), um dos idealizadores e palestrantes do evento, “ao propor um Seminário como este, o ICHS/UFRRJ faz eco a outros eventos que, fora do Brasil, têm se voltado para essa mesma questão, crucial em um momento de transformações macro-históricas que, incidindo, sobretudo, no campo das tecnologias de informação, têm alterado profundamente nossa experiência do mundo“, salienta.

O pesquisador cita como exemplos desse cenário a 12th Annual International Conference on Philosophy, ocorrida em Atenas em maio de 2017, e o XV Simpósio da Associação Iberoamericana de Filosofia Política, ocorrido em Medellín em setembro de 2017.

A abertura do evento, com a primeira conferência, ficou a cargo do presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia e professor da UFG – GO, Adriano Correia. O conferencista abordou a temática do ensino na área de humanas e a crise na cultura, em um contexto de Reforma do Ensino Médio, no qual só português e matemática se tornaram disciplinas obrigatórias.  

Na Mesa 1, mediada pela diretora do ICHS, Maria do Rosário Roxo, fizeram parte os professores Marcelo da Costa Maciel (DCS), Aparecida Maria Abranches (DCS) e Affonso Henrique Vieira da Costa (DES/IM).

O professor Marcelo Maciel, idealizador e organizador do evento e primeiro a falar, logo no início de sua exposição ressaltou: “Aqui, com meus companheiros, me sinto como os antigos guardiões que perpetuaram a filosofia de Aristóteles. É preciso filosofar mais”. O pesquisador abordou, com mais ênfase,  a questão da pós-verdade, termo que, segundo ele, foi eleito a palavra do ano pelo dicionário Oxford em 2016. Em sua exposição, traçou um paralelo com a teoria psicanalista de Sigmund Freud, pautada na ideia de que o ser humano sentiria, em alguma medida, necessidade de ser enganado. Essa ideia talvez  justifique, para Maciel, a proliferação de inverdades e do fake news, no mundo pós-moderno. 

A docente  Aparecida Maria Abranches propôs a abertura de suas reflexões com a seguinte pergunta “Quem somos nós e por que estamos aqui?”. Em resumo, trabalhou em sua fala com o que nomeou como “colapso do arquétipo do político tradicional”, utilizando como base os textos de Michel Foucault e Giorgio Agamben. Na visão da palestrante,  para o primeiro autor, os pilares da sociedade se tornariam a biologia (capacidade do homem de entender o próprio corpo e a natureza a sua volta), a linguística (capacidade de se comunicar) e a economia (capacidade de produzir). E, por fim, o professor Affonso Henrique apresentou uma profunda reflexão sobre os desafios do ensino da filosofia nos dias atuais.

“Aqui, com meus companheiros, me sinto como os antigos guardiões que perpetuaram a filosofia de Aristóteles. É preciso filosofar mais”

 

  • Conferência de abertura do evento (Foto: Lucas Meireles): da esquerda para a direita, professor Marcelo Maciel (DCS - UFRRJ), em seguida, professor Adriano Correia, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia - UFG,

 

 

As Ciências Clássicas, o homem tecnológico e o “escravismo soft” em pauta

 

Durante a segunda parte do evento, foram recebidas as professoras Simone Orlando (DLC) e Rívia Fonseca (DLC), além do professor Alain Pascal (DHRI). Simone, que é professora do curso de jornalismo, abriu a mesa trazendo uma ampla perspectiva a respeito das novas tecnologias e a importância de trabalhá-las no ambiente acadêmico. A professora destacou características que compõem o homem tecnológico do século XXI, o que inclui a percepção de que esse indivíduo está pautado na escrita e oralidades digitais; é autodidata (busca conhecer por caminhos próprios e idiossincráticos pelos sistemas de busca virtual) e expressa-se  por meio da linguagem audiovisual, sonora, imagética e textual.

A cibercultura e a inexperiência das pessoas em lidar com essas ferramentas deram abertura para que Rívia Fonseca, professora de Latim na universidade, pudesse abordar o seu tema. Rívia iniciou sua temática com uma pergunta: “Há lugar para as letras clássicas no século XXI?” e, a partir de tal indagação, mostrou um panorama no qual o latim resiste enquanto ferramenta histórica, mas também se reinventa ao se perpetuar através de novas obras literárias. A professora citou, por exemplo, trabalhos de alunos que problematizam o uso do latim em suas pesquisas, através dos livros de Harry Potter e Percy Jackson. Histórias que se utilizam da língua em seus enredos. A professora também levantou uma discussão à respeito do termo “ciência” para designar a área de humanas, preferindo se referir sempre ao campo como “humanidades”. Segundo a docente, isso nos aproximaria mais da realidade em que o ser humano, em meio a toda a sua complexidade, está no centro dos estudos das humanidades.

Fechando a mesa, o professor Alain Pascal, formado em sociologia pela UFRRJ, mas atuante no curso de História da universidade, trouxe para a discussão a chamada “escravidão soft” e suas consequências no modo como conhecemos a história. Alain retorna aos processos de colonização e imperialismo  e faz uma viagem através de seu discurso, passando pela França, Estados Unidos, África e Brasil, nos apresentando uma história que não está contada nos livros didáticos. Ao longo de sua fala, é possível perceber como a história dos povos escravizados (não como objetos da escravidão, mas como protagonistas de processos históricos) foram sistematicamente apagadas e o quanto se faz necessário o retorno a essas raízes para que possamos entender melhor nossa atual sociedade.

A última conferência foi ministrada pela professora Lúcia Teixeira, pertencente ao  Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagem – UFF, cuja temática foi “Ensino de Línguas e Compromisso Social”.  Lúcia  iniciou sua exposição evocando o pensador  Boaventura de Sousa Santos ao dizer que “vivemos um tempo de perguntas fortes e de respostas fracas”.

(Foto: Simone Orlando) – Professora Lúcia Teixeira na última conferência do evento.

Também, ao citar o pensador Alcir Pécora, a linguista explicou que as Humanidades importariam não porque ajudem a formar empreendedores, mas porque estimulariam possibilidades alternativas de
interlocução do presente pela ostensiva mediação do legado cultural.

Em síntese, a pesquisadora destacou, especificamente quanto ao estudo das Línguas, que o que se pretende é defender a ideia de que não haveria bom ensino sem boa teoria, de que não há possibilidade de fazer avançar o conhecimento oferecido pela escola se não se faz avançar também a
teoria que fornece a base de atuação prática dos docentes.

Na percepção da diretora do ICHS, Maria do Rosário Roxo, esse evento foi um protótipo de uma discussão que pode, a cada ano, se expandir mais. Para a diretora, no ano de 2019 talvez haja espaço para complexificar a pauta do papel das humanidades nesse milênio, através de um evento mais extenso, com cursos, oficinas e outras palestras.  “O importante é dar espaço para que as áreas do conhecimento de Humanas, na universidade se pensem, em suas práticas de ensino, em perspectiva inter e transdisciplinar”, explicou Roxo.

  • Generic selectors
    Exact matches only
    Search in title
    Search in content
    Search in posts
    Search in pages


  • Notícias Relacionadas

    Inovações e resistência marcaram a VII RAIC da UFRRJ

    Baixada Fluminense foi tema da Semana Acadêmica de Ciências Sociais

    PPGFIL apresenta 3º Simpósio de Filosofia Antiga

    PET Dimensões da Linguagem promove 1ª Edição do Identidades

    Feira de Relações Internacionais atrai jovens para a temática cultural no ICHS